27.1.09

Cidade sem rosto

"Procurava, a medo, encontrar o caminho de volta. Faziam precisamente 11 horas e treze minutos desde que acordara, longe do mundo que conhecia. Encontrava-se num caminho alheio ao seu, perdido entre prédios, ruas e pessoas, todas de cara desfocada, sem rosto, sem a possibilidade de um reconhecimento.
As placas com os nomes das ruas tinha sido arrancadas - seria de propósito? - e como tal era impossível de todo descobrir em que cidade estaria.
Sabia que se tratava de uma grande cidade, porque as cidades têm um cheiro próprio, a alcatrão, a fumo, a poluição, a sujidade, a ruas percorridas por gentes apressadas, loucas, desfiguradas. As vestes eram variadas, o que era explicável pela diversidade de culturas.
Não havia sons familiares, para além dos sons típicos do trânsito... era como se o mundo tivesse emudecido. E faltavam as chapas de matrículas às viaturas.
- O que vou fazer agora? - pensava enquanto não desistia de percorrer os passeios, num turbilhão de sentimentos que iam do medo à excitação.
Se ao menos se recordasse do que lhe acontecera... sabia que deveria ter estado muito tempo apagado, porque os músculos do pescoço doíam ainda da posição em que estivera durante... tempo indeterminado. Acordara com um calafrio a percorrer o corpo dormente, da falta de circulação sanguínea.Agora restava-lhe apenas encontrar um polícia, que deveria ser fácil, bastava concentrar-se na farda azul escura e no chapéu. Se encontrasse um polícia, talvez pudesse ele acompanhá-lo a casa, no seu carro patrulha.
Mas esta cidade em que ele se perdera era uma cidade imaginária, sem nome, sem rostos e sem polícia. O medo tomou conta de si, apavorou-se, desvairado percorria as ruas em círculos até enlouquecer. E ele sucumbiu à agonia que sentia, afogando-se no lago salgado."

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